LISBOA COM SUAS CASAS DE VÁRIAS CORES. Álvaro de Campos (11-5-1934)

 

LISBOA 19022017 2

Escultura de Fernando Pessoa en el Chiado 
Por Lagoa Henriques
(1923-2009)
[Foto: Lorenzo del Término (Lisboa 2017)]
 

Lisboa com suas casas
De várias cores,
Lisboa com suas casas
De várias cores,
Lisboa com suas casas
De várias cores…
À força de diferente, isto é monótono,
Como à força de sentir, fico só a pensar.

Se, de noite, deitado mas desperto
Na lucidez inútil de não poder dormir,
Quero imaginar qualquer coisa
E surge sempre outra (porque há sono,
E, porque há sono, um bocado de sonho),
Quero alongar a vista com que imagino
Por grandes palmares fantásticos,
Mas não vejo mais,
Contra uma espécie de lado de dentro de pálpebras,
Que Lisboa com suas casas
De várias cores.
Sorrio, porque, aqui, deitado, é outra cousa.
À força de monótono, é diferente.
E, à força de ser eu, durmo e esqueço que existo.

Fico só, sem mim, que esqueci porque durmo,
Lisboa com suas casas
De várias cores.

 

[Obra essencial de Fernando Pessoa (Poesia dos outros eus).
Editorial Assírio & Alvim.
Lisboa 2010.
Págs. 404-405]

 

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