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DIÁLOGO IMAGINÁRIO. «Memórias de um encontro no Chiado: Fernando Pessoa n’ “A Brasileira”, com Vicente Núñez, Lagoa Henriques e Carlos Amado». Por Luis Jorge Gonçalves, Lauro Gandul Verdún e Olga Mª Duarte Piña (Lisboa, 1998-2011)

VICENTE NÚÑEZ: «Lo que siempre se ha perpetuado es la carne como bronce.»«¡Dime tú lo que te quería decir!»

FERNANDO PESSOA: «Põe-me as mãos nos hombros…/ Beija-me na fronte…/ Minha vida é escombros,/ A minha alma insonte.// Eu não sei porqué,/ Meu desde onde venho,/ Sou o ser que vê,/ E vê tudo estranho.// Põe a tua mão/ Sobre o meu cabelo…/ Tudo é ilusão./ Sonhar é sabê-lo.»

V. N.: «Tu yo y mi tú son diametralmente idénticos.»«Sólo la literatura inglesa se salva de lo literario.»«Escribir con otro lenguaje lo aprendí de la inglesa provecta de los Baños del Carmen. Por eso Rilke, y Rimbaud…Todo lo que hablara como yo en otra tesitura.»

F. P.: «Não meu, não meu é quanto escrevo,/ A quem o devo?/ De quem sou arauto nado?»

V. N.: «Sin ajeneidad no hay yo.» «Sólo en el olvido sé quién soy.»

F. P.: «Há tão pouca gente que ame as paisagens que não existem!…»

V. N.: «Buscarse en la pérdida es hallarse en la búsqueda.»

F. P.: «Pouco importa de onde a brisa/ Traz o olor que nela vem.»

V. N.: «Me hubiera gustado, y sé que no lo he conseguido, ser un poema.» «Cuando digo yo no soy legítimamente yo mismo, sino el borroso deseo de serlo.»

F. P.: «Entre o luar e a folhagem,/ Entre o sossego e o arvoredo,/ Entre o ser noite e haver aragem/ Passa um segredo.»

V. N.: «Ciertas menudencias: ése es el secreto.»

F. P.: «Sinto que sou ninguém salvo uma sombra/ De um vulto que não vejo e que me assombra,/ E em nada existo como a treva fria.»

V. N.: «Nadie elige la oscuridad si no es por la luz que emana de ella.» «Si sois es porque ya dejasteis de serlo.»

F. P.: «…um cão verde corre atrás da minha saudade»

V. N.: «No hay que fiarse de las palabras, pero tampoco del silencio. Porque es un perro hambriento.» «El silencio soy yo.»

F. P.: «O teu silencio é uma nau com todas as velas pandas…/ Brandas, as brisas brincam nas flâmulas, teu sorriso…/ E o teu sorriso no teu silêncio é as escadas e as andas/ Com que me finjo mais alto e ao pé de cualquer paraíso…»

V. N.: «Parecida es la pureza del toro a la impureza del ángel.» «Fin de siglo. Fin del discurso. Fragmentos. Fragmentos.»

LAGOA HENRIQUES: «Recupero a imagem a ideia/ A forma degradada/ A ilusão perdida/ A história inacabada o espanto/ O sortilégio/ O banco de jardim/ O silêncio maior a morada/ A rua o bairro a porta/ A folha morta/ O tritão do claustro dos Jerónimos»

            «A mancha/ Acidental/ A estrela/ A riba/ Un friso de onze pombos// Ao vinho/ E a gordura/ Entrando no poema/ A pena de gaivota/ A gata preta/ O sonho/ O Teorema»

            «A Cesário Verde/ A Fernando Pessoa/ Ao meu avô Jacinto José Pedro/ A meus Pais/ A todos os meus Amigos/ A todos os meus Alunos/ Filhos do Sol e da Lua/ Procurar agarrar/ No correr do tempo/ Na “Passagem das horas”/ Uma mão cheia de imagens/ Surpreender o imprevisto e insólito/ O natural o simbólico/ No quotidiano visual/ Em tudo o rigor dar formas/ A metamorfose permanente/ Presente, ausente/ O privilégio, o sortilégio, da dádiva na dúvida.»

V. N.: ¡Ah, entrañables amigos de Lisboa aquí reunidos esta noche! Cualquier día, cuando tú, Mestre Lagoa, digas, quedamos con Carlos Amado en los Silos de Monturque.

LUSITÂNIA E PORTUGAL, LUSOS E PORTUGUESES. Luis Jorge Rodrigues Gonçalves (pág. 78 de «CARMINA LUSITANA» 2007)

 

 

Foi André de Resende, em Erasmi Encomium, de 1531, que desenhou o carácter honorífico que identificou Portugal como a Lusitânia. Mas é na poesia de Luís de Camões que devemos encontrar a força da assimilação entre a Lusitânia e Portugal e entre lusos e portugueses. Desde logo no título da sua principal obra Os Lusíadas, onde cantou: «As armas e os barões assinalados/ Que, da Ocidental praia Lusitana,/ Por mares nunca dantes navegados/ Passaram ainda além da Taprobana.» (I, 1, 1-4)

            Ou ainda «Que eu canto o peito ilustre Lusitano…» (I, 3, 5). Mas também quando situa Portugal na Europa: «Eis aqui, quase cume da cabeça/ De Europa toda, o Reino Lusitano,/ Onde a terra se acaba e o mar começa/ E onde Febo repousa no Oceano.» (III, 20, 1-4)

            Quando procurou a origem do nome Lusitânia, como estando associado a Baco: «Esta foi Lusitânia, derivada/ De Luso ou Lisa, que de Baco antigo/ Filhos foram, parece, ou companheiros,/ E nela antam os íncolas primeiros.» (III, 21, 5-8)

            Ou quando viu Viriato como um precursor líder português: «Desta o Pastor nasceu que o seu nome/ Se vê que de homem forte os feitos teve,/ Cuja fama ninguém virá que dome,/ Pois a grande de Roma não se atreve.» (III, 22,1-4)

            Este entusiasmo camoniano, que identificou Portugal como sucessor da Lusitânia, não podia cair no esquecimento e o conceito passou a designar Portugal, embora o conceito poético não correspondesse à realidade histórica, por não ter existido uma coincidência de territórios entre Portugal e a província da Lusitânia. Desde logo Portugal, como Estado, nasceu em Guimarães, na região de Entre-o-Douro-e-Minho, uma parte do território que não fez parte da Lusitânia. Por outro lado, a capital da Lusitânia, «Augusta Emerita», e toda a parte oriental da província, não incorporaram o território português.

            A linha camoniana, ainda no final do século XVI, teve como seguidor frei Bernardo de Brito, um monge de Alcobaça, da ordem de Cister, que concebeu uma história de Portugal que intitulou de Monarquia Lusitana, cuja primeira parte saiu em 1597 e a segunda em 1609. Se na primeira parte contém as «histórias de Portugal desde a criação do mundo até o nascimento de nosso senhor Jesús», na segunda parte continuou «as histórias de Portugal desde o nascimento do nosso salvador Iesu Christo até ser dado em dote ao Conde Dom Henrique.» Em 1614, o rei Filipe II nomeou-o «Cronista Mor do Reino» e frei Bernardo de Brito abandonou o projecto da obra Monarquia Lusitana, continuada por frei António Brandão, que na terceira parte tratou da História de Portugal, «desde o Conde Dom Henrique, até todo o reinado de el rei D. Afonso Henriques.» A oitava e última parte da Monarquia Lusitana, publicada, em 1727, por frei Manuel dos Santos, «a história e sucessos memoráveis do reino de Portugal no tempo de el rei D. Fernando, a eleição de el rei D. João I», consolidou, na historiografia, depois da poesia, a assimilação da Lusitânia a Portugal.

            Este conceito e esta obra foram importantes, particularmente no período de união da monarquia portuguesa e espanhola, entre 1580 e 1640, por fundamentar a ancestralidade histórica dos portugueses, cujas raízes estavam nos lusitanos, mesmo que não correspondesse a um rigor histórico.

            No mundo da poesia a Lusitânia transformou-se em bandeira de pensamento, como na célebre academia literária «Arcádia Lusitana», fundada em 1757, por Cruz e Silva, Teotónio Gomes de Carvalho e Estêvão Negrão, aos quais se juntou Correia Garção. Estes poetas procuraram sintetizar em «Arcádia» a adesão uma estética neoclássica, com fundo na Razão e no culto do Natural, e em «Lusitana» realçar o seu carácter português.

            Nas ciências a «Sociedade Arqueológica Lusitana» (1849-1857), promoveu trabalhos arqueológicos em Tróia, de procura da ancestralidade. 

            Em 1822, António Feliciano de Castilho, em A Primavera, introduziu a noção lusitanismo, como o modo de falar ou escrever da língua portuguesa, fazendo deste modo entrar conceito de Lusitânia na identificação do idioma português. Ricardo Jorge, em Brasil Brasil! (1880-1939), criou o conceito de lusitanista, como o que estuda a língua e cultura portuguesa.

            O século XX trouxe esta adjectivação para a política, como os Lusitos, jovens da Mocidade Portuguesa entre os 7 e os 10 anos, ou os Viriatos, grupo de voluntários portugueses que participaram na Guerra Civil de Espanha (1936-1939).

            Hoje a Lusitânia, recuperada por humanistas, cantada por poetas é sinónimo de lusofonia, de portugueses, unindo uma vasta comunidade. Mas foi a Lusitânia, província romana, origem de dois povos que estão próximos.

 

«CARMINA» Nº 3